Promover a beleza
Na abertura do seminário, o diretor do Departamento de Comunicação do IICS Carlos Alberto Di Franco salientou que “o urbanismo é um processo civilizatório, dentro do qual é fundamental a promoção da beleza”, pois, segundo ele, “só por meio dela o mundo será salvo”. Veja que o enfoque destacado por Di Franco é muito mais filosófico do que pragmático ou técnico. Enfim, essa é mais uma faceta de um caleidoscópio de opções que se oferece para discussão.
Além de bela, no seu conceito mais puro, a cidade também deve ser sustentável e inteligente, como deixou claro o arquiteto, urbanista e professor universitário Carlos Leite. Segundo ele, a cidade é o maior artefato já criado pelo homem. Dentro desses conceitos, ele escreveu, juntamente com Juliana di Cesare Marques Awad, o livro Cidades Sustentáveis, Cidades Inteligentes, em que trata com profundidade de todos os aspectos relacionados com o desenvolvimento sustentável num planeta que é, cada vez mais, urbano.
Durante o seminário, o especialista deixou uma questão, no mínimo, intrigante: se sabemos o que fazer para recuperar/reorganizar as cidades, por que não o fazemos? Há uma infinidade de planos, alguns muito bons, mas não há, em contrapartida, ação efetiva de colocá-los em prática. Diante desse questionamento, é possível perguntar: vontade e força política seriam os fatores que estão faltando? Carlos Leite, que não acredita em soluções mágicas, prega o uso do planejamento e da gestão técnica no desenvolvimento dos planos urbanos. Além disso, uma cidade como São Paulo não é uma ilha isolada do resto do estado e do País. Ela, na condição de megalópole, interfere e sofre influências das cidades vizinhas (entre as quais podem ser incluídas Osasco, Guarulhos, o ABC paulista, Campinas, Sorocaba, São José dos Campos, Santos e outras) e dos projetos dos governos estadual e federal, daí a importância de se planejar as ações abrangendo a região como um todo e considerando todas as interfaces possíveis.
Uma cidade burra – Mas, São Paulo está longe de ser uma cidade sustentável e inteligente, na opinião da jornalista Fabíola Cidral, âncora do programa de rádio CBN São Paulo, que acompanha diariamente os fatos que ocorrem na capital paulista. “É uma cidade burra”, diz ela, acrescentando que o déficit habitacional é enorme, que quase metade da população vive precariamente e que praticamente a totalidade de seus habitantes não se sente segura. O resultado da insegurança alimenta, erroneamente, o desenvolvimento de projetos habitacionais que isolam os moradores em condomínios fechados e, em geral, longe dos seus locais de trabalho. Já para a população de baixa renda sobram as habitações populares construídas, muitas vezes precariamente, nas periferias da cidade, também distanciadas dos centros que aglutinam as ofertas de trabalho. Isso se reflete, obviamente, no agravamento dos problemas de transporte público e de mobilidade urbana. Segundo Carlos Leite, “viver no gueto [seja ele qual for], mata a cidade”.
Numa outra ponta da questão urbana está o mercado imobiliário, que, muitas vezes, é apontado como vilão do processo. Cláudio Bernardes, presidente do Secovi, refuta a acusação lembrando que o setor não inventa leis; atua rigorosamente dentro das regras estabelecidas e de acordo com as demandas existentes. A proposta para a solução de alguns problemas urbanos que a entidade representativa do setor imobiliário oferece inclui a criação de polos autossustentáveis, com o adensamento dos modais de transporte público ao longo de eixos que integrem esses polos e a racionalização do uso misto do solo urbano.
Pouco metrô – Em contrapartida, Carlos Tramontina, da TV Globo, na sua participação durante o seminário, disse que o setor imobiliário pode não ser o culpado por todos os problemas das grandes metrópoles, mas que deveria fazer muito mais do que efetivamente vem fazendo. Lembrou também que os administradores públicos vêm carecendo de maior sintonia com as reais necessidades da população. Tramontina lembrou que um grupo político esteve durante 20 anos no poder do Estado de São Paulo e, nesse período, teve governador que não construiu um quilômetro de metrô na capital paulista. Nesse cenário, como lembrou bem o jornalista José Paulo Kupfer, colunista do jornal O Estado de S. Paulo, pesa muito a ação nefasta da corrupção, que impede que os planos e ações funcionem bem. Recentemente, tivemos mais um escândalo envolvendo o governo paulista, o metrô, que está sob a sua responsabilidade, e algumas empresas fornecedoras. Segundo ele, a reforma política é fundamental, já que as prioridades dos governantes estão de cabeça para baixo em relação às demandas da população.
Por fim, representando o lado oficial da questão urbana, o secretário municipal de Desenvolvimento Urbano Fernando de Mello Franco salientou que existem 11 milhões de modelos de cidade, indicando que cada um dos habitantes da capital paulista tem o seu conceito particular de ambiente urbano em que gostaria de viver. Para ele, mais importante do que “a São Paulo que queremos” é “a São Paulo que pactuaremos”. E, para que esse pacto fosse possível e plausível, o Plano Diretor foi amplamente discutido em diversos canais, inclusive virtual, e que a revisão da lei de parcelamento e uso do solo urbano (cujo prazo de conclusão está previsto para o final do primeiro semestre de 2014) também deverá ser fortemente participativa. O secretário rechaçou, veementemente, que a cidade de São Paulo seja a representação do caos. Fosse assim, segundo ele, não abrigaria 20% da população brasileira e não representaria 20% do PIB nacional.