O desafio de garantir moradia para todos
Romeu Chap Chap *
O anúncio da segunda fase do programa governamental Minha Casa, Minha Vida traz importantes avanços. De acordo com as primeiras notícias – que serão confirmadas na edição da lei, foi feito o necessário ajuste no valor máximo dos imóveis nos grandes centros urbanos, como São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília (de R$ 130 mil para R$ 170 mil). Além disso, a faixa de renda foi corrigida, permitindo que famílias com rendimentos de até R$ 5 mil sejam beneficiadas.
Com recursos da ordem de R$ 125,7 bilhões até 2014, oriundos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e do Orçamento Geral da União e suficientes para mais de dois milhões de moradias, o programa vai privilegiar a baixa renda – 60% do total será destinado àqueles com salário mensal de R$ 1,6 mil.
O Minha Casa, Minha vida se consolida como o mais consistente programa de habitação de interesse social dos últimos tempos e merece ser adotado como uma verdadeira política nacional (apartidária).
Todavia, é preciso que todos os brasileiros possam ter acesso à moradia. Nesse aspecto, temos aí um segmento da população, entre a baixa e a alta renda, que precisa ser considerado.
Hoje, essa faixa é atendida pelos agentes do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), com recursos da caderneta de poupança.
Esses financiamentos reapareceram após quase duas décadas de minguadas operações. Entre 1986 (quando inexplicavelmente foi extinto o Banco Nacional da Habitação – BNH) e 2004 (ano da instituição do novo marco regulatório do crédito imobiliário), os empréstimos foram inexpressivos. Aliás, em 2004, financiou-se em âmbito nacional apenas R$ 3 bilhões.
Com a segurança proporcionada pelo marco regulatório a financiadores, compradores e empreendedores, o volume de empréstimos do SBPE somou R$ 52 bilhões em 2010, e deve chegar a R$ 85 bilhões este ano.
A demanda é sólida. A classe média, que já corresponde à metade da população brasileira, assumiu seu devido lugar no mercado imobiliário e passou a ser alvo preferencial das empresas do setor.
Além disso, graças ao fenômeno do bônus demográfico (as crianças dos anos 80 e 90 são os compradores de hoje), há uma massa de pessoas que vai demandar 23 milhões de novas moradias nos próximos 12 anos.
Mas esse cenário não permanecerá confortável indefinidamente. Cedo ou tarde a caderneta de poupança será insuficiente para atender a todos, o que obriga estudar desde já novas fontes de recursos, tarefa à qual já se dedicam entidades como o Secovi-SP e a Abecip (que representa os agentes financeiros).
Importante lembrar que a ferramenta já existe. Trata-se do Sistema Financeiro Imobiliário (SFI), que foi criado em 1997, mas necessita de algumas condições para se tornar operacional.
Uma delas é a padronização dos contratos para facilitar a análise dos ativos em carteira de incorporadoras e agentes financeiros. O setor trabalha para equacionar essa questão e é esperada uma solução para breve.
Porém, há outro aspecto fundamental, e que independe do setor: a taxa de juros. O Brasil possui a maior taxa real de juros do mundo (6,8%), utilizada como ferramenta de política econômica.
Não se nega a necessidade dessa medida. Pior que taxas de juro elevadas é o aumento da inflação. Esse é um mal que ninguém deseja ver ressuscitado. Ele acaba com qualquer chance da previsibilidade indispensável para a compra do imóvel, pois a pessoa precisa confiar que continuará empregada e que poderá pagar as prestações.
Todavia, é necessário que as medidas macroeconômicas não se limitem aos juros. Afinal, enquanto as taxas permanecerem elevadas será impossível colocar em prática instrumentos do SFI, como a securitização dos ativos imobiliários, mecanismo que pode garantir sustentabilidade aos financiamentos habitacionais e cujos principais investidores são os fundos de pensão e seguradoras.
O País precisa de um modelo que permita ao SFI complementar o tradicional Sistema Financeiro da Habitação. Mais que novos proprietários de habitação, essa conjugação repercute no desempenho da economia nacional. Garantir o bom desenvolvimento da indústria imobiliária é garantir que se confirmem a previsão otimista de que o Brasil só será superado pela China em ritmo de crescimento nos próximos anos.
* Presidente do Conselho Consultivo do Secovi-SP e da Romeu Chap Chap Desenvolvimento e Consultoria Imobiliária