Empreendedor precisa interpretar o novo consumidor para atender seus desejos
Qual é o rosto do novo brasileiro e qual a sua relação com a moradia? A resposta para esta questão foi apresentada durante o seminário Tendências do Mercado Imobiliário, realizado na terça-feira, 5/7, na sede do Secovi-SP. Mais especificamente, na palestra de Renato Meirelles, sócio do Instituto Data Popular, em painel que teve como debatedor o empresário Eduardo Gorayeb, diretor presidente da Rodobens Negócios Imobiliários.
Há cerca de 10 anos, o instituto começou a pesquisar os hábitos de uma parcela da população na qual, até então, ninguém acreditava. Meirelles disse que parte dessa descrença era motivada por preconceito. “Depois, as pessoas a sentir orgulho de se incluir nessa faixa.”
A chamada classe C compõe um mercado dinâmico, ávido por consumo, e que tem impacto direto no setor da construção. De acordo com estimativas do Data Popular, até 2014, seis de cada dez brasileiros estarão inseridos nessa camada social. São pessoas que estão melhorando de vida, mas que ainda mantêm padrões e comportamentos das classes D e E. Trata-se de uma classe com poder de compra nunca antes visto no País, mas, para conseguir vender para esse novo consumidor, é preciso, em primeiro lugar, compreender sua dimensão, seu tamanho e volume.
Os números impressionam: a classe média movimenta R$ 881 bilhões por ano, representa 50% da população, 46% do consumo, 59% dos cartões de crédito e 61% dos internautas. “São milhões de brasileiros que transformam sonhos em projetos de vida”, enfatizou. “O que mudou para essa parcela da população foi a possibilidade de pensar a longo prazo”, continou.
Otimismo e confiança – Cinco vetores influenciaram o poder de compra da baixa renda. O primeiro é a grande fatia de jovens das classes C, D e E (com ingresso de 1,2 milhão de novas famílias na classe C). Há também o fator de ascensão social, já que a classe C não quer recuar; a elevação dos níveis educacionais (cada ano de estudo implica em incremento de 15% no salário, até a graduação) e a alta real dos rendimentos.
O quinto vetor foi o aumento de programas de renda – que, na opinião do palestrante, transformaram-se em política de Estado, não de Governo. “No auge da crise econômica, por exemplo, o programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV) criou empregos e movimentou a economia. E, é claro, ampliou a possibilidade de se comprar um imóvel”, disse.
A classe C é a mais otimista e a que mais compra. O ambiente positivo dos últimos anos favoreceu a melhoria da qualidade de vida e provocou importante impacto no mercado imobiliário. A intenção de adquirir imóvel nos próximos 12 meses mais que duplicou na comparação entre o primeiro trimestre de 2009 e igual período de 2011: passou de 4,4 milhões de famílias para 9,9 milhões. Desse total, na chamada nova classe média, essa intenção representou um salto de 1,5 milhão de famílias para 4,7 milhões, enquanto a baixa renda subiu de 1,3 milhão para 3,5 milhões, e na alta renda variou de 1,5 milhão para 1,7 milhão.
Outra informação: geograficamente, o dinheiro está mudando de mãos, com a ascensão do mercado na periferia. Pequenos empreendedores passaram a ganhar mais em bairros periféricos, enquanto a região central registra queda no consumo.
O novo brasileiro – “O Brasil é negro e tem orgulho disso. A relação entre etnia e classe social impacta na autoestima”, destacou Meirelles. Antes, as pessoas não se identificavam, mas, hoje, fazem questão de declarar a origem e de ocupar seu espaço. “É um grande avanço, que nada tem a ver com a cor.” Os negros movimentam, conforme o Data Popular, R$ 546 bilhões por ano só em salários, sem contar crédito. O palestrante lembra que, ainda assim, as ações de mercado não contemplam este público.
Outra constatação: o consumidor da nova classe média brasileira é, na verdade, consumidora. As mulheres levam o marido para o estande de vendas, onde todo o foco é concentrado nele, mas quem decide é ela.
Na avaliação de Meirelles, o padrão técnico de comunicação torna o empreendedor míope. “As mulheres já mandavam no dinheiro do homem, e agora mandam mais ainda. De cada R$ 100 da classe C, R$ 41 vêm da mulher; 25% do total da renda da classe A corresponde a elas, enquanto na classe C esse montante chega a 41%.”
Para o consumidor da classe emergente, ter a casa própria é, antes de tudo, ser dono da própria vida. Dos 9,9 milhões de brasileiros que pretendem comprar imóvel, 47,5% são da classe média. Mas é importante ressaltar que aqueles que vivem em moradias alugadas ou cedidas também compõem o mercado habitacional e têm poder de compra. Do déficit habitacional de 8,1 milhões, 89% se concentram nas famílias que ganham até três salários mínimos.
A decisão de escolha do imóvel envolve aspectos emocionais, como segurança, localização (parentes próximos) e características do imóvel. Dentre os racionais, estão valor do imóvel e da prestação, tamanho e localização (considerando facilidade de acesso). Há curiosidades sobre a preferência do novo consumidor: para ele, a sala é o principal espaço de convivência, mas o quarto é o ambiente no qual se permanece por mais tempo.
As sondagens mostram que, quanto menor a renda, maior é o medo em adquirir o imóvel. Para as classes C, D e E, o principal temor é não conseguir pagar, não obter financiamento, atrasar parcelas ou não receber o imóvel. Já as classes A e B temem não receber o imóvel.
Renato Meirelles disse que o crescimento do mercado de baixa renda é fato nos próximos 15 anos. Com base na experiência, acredita que a demanda por imóveis surgem de três tipos de consumidor: o que mora precariamente, aquele que paga aluguel e o que deseja constituir família. Hoje, ele tem mais acesso à educação e prefere permanecer no bairro onde mora. “A compra do imóvel envolve sonhos e preocupações, mas a marca que conquistá-lo se tornará sua parceira”, concluiu.
Evento focado – Eduardo Gorayeb iniciou suas ponderações como debatedor ressaltando nunca ter visto um evento tão focado, com pessoas tão especializadas: “A Accenture trazendo pesquisa sobre comportamento, a Serasa Experian falando sobre Cadastro Positivo e o Renato, do Data Popular, mostrando quem é a nova classe”, destacou.
“Temos um mercado consumidor muito grande e precisamos saber interpretar o desejo desse público. Dez anos atrás, pesquisávamos um produto chamado carta de crédito. Depois, com base em pesquisa, descobrimos que a maior preocupação da classe mais baixa era o fator segurança, e viabilizamos o primeiro condomínio para essa faixa da população. Fizemos um piloto e foi sucesso de mercado”, lembrou.
O empresário contou ainda que diversos conjuntos habitacionais surgiram, sendo vendidos rapidamente. E, com a mesma velocidade, passaram a ser modificados e reconfigurados.
“Temos um mercado imenso a ser explorado, mas precisamos entender esse público e delinear ações para atendê-lo. Vendemos bairros, e não casas; vendemos modo de vida, e não habitações. O desejo do consumidor é o empreendedor que define, por meio de pesquisa”, encerrou.